Disco: Aquarela do Brasil: A Senhora Gal


Gal faz disco que não supera show

Foi duro chegar lá, e por enquanto, aos 35 anos , Gal Costa não quer arriscar nada. Por isso esse disco que lança, por força do contrato com a Polygram, "Aquarela do Brasil", foi cuidadosamente preparado para brilhar apenas discretamente e não prejudicar a carreira do show "Gal Tropical", que já dura dois anos e o produtor Guilherme Araújo espera prolongar até 1981.

Fantasiada como uma rumbeira vermelha desenhada por Guilherme Guimarães e cantando "Índia" e "Força Estranha", Gal já esteve no Japão, em Montreux, Campinas e Belo Horizonte com o show e ainda há centenas de cidades brasileiras juntando os 400 000 cruzeiros que ela cobra para cruzar o palco em correria desvairada ao som da marchinha "Balancê" de João de Barro.

O trabalho é grande e Gal precisa terminar sua casa na Barra da Tijuca e pagar três sessões semanais do analista. Orgulhosa, quer mostrar ao maior número possível de pessoas a que ponto de beleza e profissionalismo chegou sua carreira, tão acidentada antes de "Gal Tropical".

Não há mistérios: poucos foram tão tropicais quanto Ari Barroso, de quem são todas as músicas do disco. É possível ver as palmeiras prateadas do cenário do show tremelicando ao som de "Aquarela do Brasil". Gal ouviu cerca de 400 e escolheu o melhor das várias facetas do mineiro de Ubá. Do mestre do samba canção, ficou com "Folha Morta" e "Tú", em que se redescobre essa pérola da excêntrica coleção de imagens de Ari: "Teus lábios, duas joias de coral/no engaste sensual da tua boca". Do compositor de música para teatro, interprete "Na Baixa do Sapateiro", com Caetano Veloso. Do samba brejeiro estão "Camisa Amarela" e "Faceira". Gal também parece ter selecionado as músicas que melhor se adaptassem ao show. "É Luxo Só", por exemplo, cantam as mesmas mulatas de "Olhos Verdes" de Vicente Paiva e até ganhou um arranjo sob a forma inspiração, do samba-funk. Se o público se cansar de "Balancê", Gal retira do disco "Novo Amor" - e todos dançarão animados novamente um animado carnaval. "Aquarela do Brasil", samba exaltação ao "coqueiro que dá coco", já está no show. "Sonho Meu", que pedia a anistia, foi superada pelos acontecimentos. Por fim, Gal também escolheu uma música quase desconhecida, "Jogada Pelo Mundo", na qual reconhece a vida de um artista: "Tenho a canção dos pescadores/tenho essa vida de mil amores/molho meus pés nas lindas águas dos igarapés."

Imagem Nova - Na capa, toda em verde e dourado, Gal confirma a imagem da cantora sóbria e madura que começou a apresentar nesses dois últimos anos, um choque para os que a cultivam como a guerrilheira de pés descalços, ídolo do início dos anos 70. No lugar das flores vermelhas entre os cabelos, exibe agora uma penca dourada, com ares ainda mais respeitáveis que antes. Está uma senhora, quer ser interpretes dos grandes clássicos da música brasileira. Um novo adeus para Wally Sailomoon, Jorge Mautner e tantos companheiros de loucura.

Joaquim Ferreira dos Santos - Revista Veja


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