Em sua estreia na Trama, Gal grava compositores pouco conhecidos


 Foto: Marlene Bergamo
Gal faz garimpo musical e lança álbum de inéditas
Por Luiz Fernando Viana*

Depois de sete anos lançando discos com repertório isentos de novidades, Gal Costa volta ao  presente com "Hoje". O título significativo foi retirado de uma canção de Moreno Veloso, que, não fosse filho de Caetano Veloso, poderia entrar no rol de compositores pouco ou nada conhecidos do CD.
"Achei que "Hoje" se adequava, porque estou fazendo 60 anos com um disco rejuvenescedor, instigante. Não me lembro na história da MPB, de alguém que tenha lançado tanta gente nova para o grande público", orgulha-se a cantora.
Gal passou os últimos anos trocando de gravadora (BMG,MZA,Abril,Indie) e sendo cobrada para lançar um disco de inéditas. Agora na Trama e morando em São Paulo - depois de sete anos em Salvador - ela diz ter ficado mais próxima dos novos autores.
"É preciso ter disponibilidade para ir a lugares, procurar. Os compositores estão escondidos e têm dificuldade de mostrar seu trabalho. Na minha  era mais fácil, pois havia os festivais e a mídia estava disponível para registrar tudo o que acontecia nas ruas, nas faculdades, nas festas".
Com a ajuda da Trama e do letrista Carlos Rennó, Gal recebeu cerca de 200 músicas inéditas ou gravadas apenas por seus autores. A qualidade que afirma ter encontrado é um mote, para ela rechaçar que tenha afirmado,em 2001, que não havia bons compositores novos no Brasil.
"Não sou louca de dizer uma frase dessa. Fui mal interpretada. O que disse é que , quando fiz  "Aquele Frevo Axé" (1998), um disco que passou em branco e hoje parte da imprensa reconhece como bom e de certa forma inovador, não encontrei nada que se adequasse ao meu universo musical. Existem bons (compositores) sim", afirma.
Aguns desses, estão em "Hoje": os baianos Moisés Santana, Péri e Tito Bahiense; o pernambucano Junio Barreto; o paulistano Hilton Haw. Há outros "novos compositores" de outras áreas, como os artistas plásticos Nuno Ramos, Eduardo Climachauska e Lenora Barros, e o jornalista Marcos Augusto Gonçalves, editor de opinião da Folha.
"Peri, Moisé e Junio, por exemplo, gravaram discos independentes e estão ralando há bastante tempo, mas ninguém dava trela. Tive a oportunidade de ter acesso a esse material e lançá-lo, diz Gal
Liderando a turma, autora de três das 14 faixas, está dupla formada por Carlos Rennó e o músico Lokua Kanza, nome conhecido na seara word music, nascido no antigo Zaire, hoje República Democrática do Congo.
"No show que vou começar a montar, ainda pretendo incluir um ou dois compositores que eu queria ter gravado, mas ficaram de fora", conta ela.
Representando sua geração, estão, com uma inédita cada, Caetano Veloso ("Luto) e Chico Buarque ("Embebedado" com letra de José Miguel Wisnik). Eles aparecem discretos no disco, nas faixas 9 e 13, respectivamente. "A escolha das faixas foi casual", diz Gal.
"Hoje" foi feio de uma forma pouco comum nos tempos atuais: com uma mesma banda tocando em quase todas as faixas e um mesmo arranjador, César Camargo Mariano. "César vive um momento bem "cool", e eu sou uma cantora essencialmente "cool"."
O sonho inicial de César, de fazer com a cantora um disco dedicado ao repertório de Chet Baker, ficou para 2006.
Foi o pianista que fez a ponte entre a Trama, de seu enteado João Marcelo Bôscoli, e Gal Ela nega que tenha sofrido pressões de gravadoras nos discos anteriores ("Eu estava gravando as coisas que queria"), mas se diz feliz em ter seguido o caminho das independentes, como também fizeram os também "medalhões" Chico Buarque e Maria Bethânia.
"Eles (da Trama) gostam de fazer o que o artista quer, trabalhar em comunhão. Isso não tem preço. É um clima muito melhor do que o anterior", comenta.
Ela não deixa nenhum temor por estar lançando um CD de compositores novos por um selo menor: "Meu público é fiel".
"Hoje" chega "rejuvenescedor" e um momento muio ruim do país. "É desolador o PT ter vindo com um discurso de mudança, e acabar sendo revelado que (o partido) não era só conivente, mas fez tudo em dobro. espero que esse processo seja um exorcismo, para limpar essa bandalheira. Estou muito entristecida".

*matéria veiculada na "Folha de São Paulo", em 2 de setembro de 2005

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